domingo, 26 de janeiro de 2014

O Palhaço que Chora

(Personagem entra em cena só com um banco, vestido como um palhaço mas com a maquilhagem borrada. Pousa o banco e senta-se nele calmamente. Depois de uma pausa, encara o público)


Às vezes gostava que o mundo nos desse pistas…
Sei que às vezes ele acaba por fazê-lo, mas queria que o fizesse até para pessoas como eu, menos perspicazes, conseguirem entender.

Eu tenho noção que o trilho é atribulado, que existem obstáculos difíceis de contornar, desilusões difíceis de aceitar e lidar, mambos que inevitavelmente nos fazem tossir sangue, numa taquicardia tão intensa que nos faz estagnar, cambalear…

Sinto-me desequilibrado, mais do que alguma vez fui e não num muito bom sentido: oscilo entre a depressão intensa, lembranças saudosistas do que não posso voltar a agarrar, e o palhaço sorridente que tanta gente vê… Esse palhaço que hoje, como há uns dias para cá, tem ficado na sua toca, no seu circo perdido no buraco negro do meu cérebro…

Mas eu só queria uma pista, visível, que fizesse os meus olhos brilharem, algo certo e concreto que fizesse a minha boca abrir com espanto e dizer: É isso! Mas é tudo tão incerto, tão irremediavelmente doloroso… O palhaço que tanto sorri, tenta que eu pouco pense, que viva no momento presente e mais nenhum, mas a minha outra veia teima para pensar e repensar, cada movimento, e sinto que cada vez vou-me prendendo mais. GRRRR que raiva! Que frustração! Teimar em querer coisas da maneira que fantasio na minha utopia irrealista e sobrenatural, onde foi toda a minha realidade?

É isso que hoje sinto: Realidade. E acho que estou a vislumbrá-la pior do que ela realmente é… Melhor assim. Ao menos preparo-me para o pior, talvez o melhor ganhe um novo significado…
Agora vou… já vejo o palhaço que sorri a tentar sair. Eu vou para dentro. Voltarei em breve.


Eu volto sempre.


Escrito por mim, André Pereira dos Santos, no dia 27 de Janeiro de 2014

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Como uma Pena



Perdido num nevoeiro denso,
sem um palmo certo de visão,
caminho pelo matagal, tenso,
de eucalipto é este incenso
que cheiro sem dar atenção.

Aparento estar sozinho.
É o que diz a minha compreensão.
Não sinto qualquer ruído vizinho,
nem vejo o rasto de linho
deixado por D. Sebastião.

Respiro diafragmaticamente,
e procuro a minha calma interna.
Quero largar o peso que me prende,
e ficar leve como uma pena.

Dúvida, incerteza…
Só densificam esta maldita neblina,
eliminam toda e qualquer clareza.
Talvez seja esta a minha sina.

Mas floresta tão pura, tão plena,
que se alimenta do meu dilema,
acompanha-me nesta luta!

E levito na leveza de uma pena,
como se fosse do filme, a cena
daquele final, onde tudo resulta.


Escrito por mim, André Pereira dos Santos, no dia 2 de Janeiro de 2014